segunda-feira, 20 de junho de 2011

NOTÍCIAS DO SUDÃO DO SUL‏

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Leer, 19 de junho de 2011.

Festa da Trindade Santa.

Caro amigo,
a você fraternas saudações em Cristo nosso Senhor. Espero que esta carta lhe encontre com muita saúde e em paz. Quanto a mim estou bem. Aproveito para partilhar mais um pouco da minha experiência missionária e as expectativas sobre a independência que se aproxima e o rumo que a nossa missão evangelizadora busca seguir nesse novo país.
Já faz um ano desde que cheguei ao Sudão do Sul (19 de junho 2010) e no fim de julho fará um ano que estou vivendo e trabalhando com o povo Nuer. Como o tempo parece passar tão depressa e quanto tenho aprendido nesse ano de vida missionária no Sudão, coração da África?! Aprendi muito sobre a realidade social, política, econômica, cultural e religiosa. Aprendi muito sobre os missionários que se doaram por este povo a serviço Evangelho. Aprendi muito sobre o jeito de fazer missão nessas terras. Aprendi muito sobre mim... e tenho muito o que aprender.  
Estou trabalhando entre o povo Nuer em uma das missões mais difíceis do Sudão do Sul, onde há muito trabalho e poucos missionários. Na época das chuvas o acesso a muitas comunidades fica reduzido e o trabalho pastoral comprometido. A língua Nuer não é uma das mais fáceis de aprender, porém se consegue. Para tornar a vida do povo do Sudão do Sul ainda mais difícil, recentemente o governo do Sudão impôs um bloqueio econômico na fronteira. Com isso os poucos alimentos e combustível que chegam são muito caros e o povo que já é muito pobre sofre mais ainda.
Tem havido muitos conflitos internos envolvendo milícias e as forças do governo e também enfrentamento entre as tribos. Recentemente isso tem diminuído, mas os conflitos entre o exército do Norte e do Sul continuam, sobretudo nas áreas onde há petróleo. Há ameaça de guerra somente na fronteira entre as duas regiões (Sudão do Sul e do Norte). Aqui onde vivemos felizmente não há conflitos, os desafios são outros.
Apesar das dificuldades o povo Nuer, como todas as tribos do Sul, é muito resistente e profundamente religioso. É um povo bastante hospitaleiro e de cultura e tradições muito fortes. Todavia, carrega também suas contradições. Eles e o país como um todo ainda vivem a experiência do pós-guerra: conflitos, agressões, atitudes violentas, corrupção, etc., o que torna difícil, mas não impossível, construir um projeto de nação para todas as pessoas superando o antigo tribalismo.
A Igreja esteve sempre do lado do povo, especialmente no tempo da guerra. Agora sente o desafio de ser presença evangelizadora não mais numa região de guerra e contínuos conflitos, mas numa nova nação com outros tipos de desafios. Estamos a cerca de vinte dias para que seja proclamada oficialmente a independência do Sudão do Sul (09 de julho 2011). Como me sinto diante de tudo isso? Qual o sentindo e como vejo a minha presença missionária nesse novo país?
Primeiramente, me sinto contente com a missão que realizo e com a comunidade na qual me encontro. Além disso, todos que se encontram nessa terra vivemos esse momento histórico com grande expectativa e com muita esperança. Vejo que a independência política foi uma grande conquista e que custou a vida de dois milhões de pessoas. Há, porém, muitas outras independências a serem alcançadas, por exemplo, como ajudar o povo a caminhar com os próprios pés e a não depender de ajuda humanitária. Sinto-me desafiado como presença missionária a ajudar nesse processo.
Em segundo lugar, os povos dessa região são profundamente religiosos, portadores de ricas tradições e culturas, mas não suficientemente evangelizados. Também me pergunto como melhor ajudar o povo a conhecer e experimentar a história da salvação a partir de suas experiências religiosas, a valorizar suas religiões tradicionais através da inculturação e diálogo. Além disso, sinto o desafio de como colaborar para construir uma cultura de paz, direitos humanos e a tão urgente e necessária reconciliação entre povos que sofreram violência por muitos anos e aprenderam a ser violentos e que ainda carregam consigo os traumas da guerra.
A minha presença missionária é expressão de um grupo maior. Formamos uma família missionária que também se interroga diante de tantos novos desafios. Procuramos nos comprometer com a formação das lideranças desse novo país a partir dos valores evangélicos e ser presença transformadora a partir da força da Palavra de Deus. É nosso compromisso promover justiça, paz e reconciliação, autênticos valores do Reino de Deus, no meio e com o povo, conscientes de que há outras formas de evangelização. Para isso rezamos, procuramos novas estratégias e colaboradores. Confiamos também nas suas orações, pois precisamos construir uma nova ‘nação de cada tribo, língua e povo’ e desenvolver uma nova ação evangelizadora.
Por fim, rezo para que a Trindade Santa seja nossa proteção e luz divina inspiradora. Que a mesma Trindade abençoe a você e sua família e os conserve na saúde e na paz. Muito axé e ternura do Deus da vida.
Raimundo Rocha – MCCJ – Leer, Sudão do Sul

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